E-mail de Joaquim N.: “Professor o verbo
chegar tem mais de um particípio? É possível dizer, por exemplo, que alguém tinha ‘chego tarde’?
Agradeço o esclarecimento.”
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O verbo “chegar” não se inclui entre os
abundantes que apresentam particípio duplo. Tem apenas uma forma no particípio
(chegado), que se conjuga na voz ativa com o auxiliar “ter” (ou “haver”) nos
chamados tempos compostos (“Pedro tinha
chegado cedo”, por exemplo).
Há quem considere “chego” como particípio
irregular, no entanto isso constitui um erro (além, claro, de soar
mal). Os particípios irregulares (frito, disperso, morto etc) aparecem
usualmente na voz passiva (com os auxiliares “ser”, “estar”, ficar”), ou seja, os verbos dos quais constituem os particípios são transitivos diretos. Não
é o caso de “chegar”, que é intransitivo
e, como tal, não se conjuga na voz passiva.
Mesmo quando aparece como depoente, ou
seja, quando tem forma passiva mas sentido ativo, “chegar” não apresenta a
flexão “chego” no infinitivo. Diz-se “É chegado
o verão”, e não “É chego o verão”.
A propósito, os únicos casos de uso do
particípio irregular na voz ativa estão representados pelos verbos “ganhar”, “gastar”
e “pagar”. Pode-se dizer, por exemplo, “ele tem ganho (ou ganhado) muito dinheiro”; “seu irmão tem gasto (ou gastado) muito” e “Armando
não tinha pago (ou pagado) seus
compromissos em dia”. Veja que esses três verbos são transitivos diretos.
Não
há elitismo nem preconceito em condenar o uso de “chego” como particípio
irregular. Pode-se condená-lo, sim, por resultar de uma falsa analogia (com os
verbos transitivos diretos que admitem particípios irregulares) e, sobretudo,
por soar mal. Queira-se ou não, a eufonia é um critério que deve ser
considerado.
Ninguém nega a força criativa do povo para modificar a língua
(afinal, ele é quem a faz), mas não se deve admitir "qualquer coisa" simplesmente por ela ter
origem popular. Afinal a língua tem seu gênio, seus princípios, suas normas, que em alguma medida restringem os usuários em nome da
inteligibilidade e do bom gosto. A forma “chego” só existe na primeira
pessoa do singular do presente do indicativo (por exemplo: “Eu chego já”). E
chega.