sexta-feira, 26 de abril de 2019

Dúvida sobre generalização a partir de uma questão da Vunesp



2019 VUNESPUma expressão que atribui à frase um tom de generalização está destacada entre parentes em: A Há que se dizer que culpar terceiros (sempre) nos traz alívio. (1º parágrafo) B (Um dos )maiores responsáveis por alagamentos nas cidades é o lixo... (2º parágrafo) C Nos dias de hoje coletamos informações (prontas)... (3º parágrafo) D ... cotidiano agitado e( quase) atropelado pelo que não nos afeta... (3º parágrafo) E ... quase atropelado pelo que não nos afeta tanto (por enquanto). (3º parágrafo)
Laura Silva
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          Bem-vinda, Laura.
          Generalizar é considerar que determinadas características ou ações se aplicam a todo um conjunto de pessoas. Pode constituir uma grave falha na argumentação, pois não leva em conta as possíveis exceções. Basta que uma delas ocorra para fazer o argumento ir por terra.
         Generalizar é também tratar subentendidos como pressupostos. Um exemplo: numa redação sobre o trabalho da mulher fora de casa, um de meus alunos se posicionou contra, alegando que esse tipo de atividade prejudica a educação dos filhos. Ele pressupôs como verdadeiro algo que subentendeu (apoiado numa visão machista, por exemplo), como se todo subtendido não dependesse de uma interpretação pessoal. Essa era a opinião dele, que não tinha o direito de generalizar.
          Já deu para você perceber que a resposta à questão está na letra “A”. O advérbio “sempre” dá como genérica e inevitável a afirmação de que pôr a culpa em terceiros nos traz alívio. Pode às vezes não trazer... A propósito, será que traz mesmo? A banca dá uma mãozinha quando apresenta na resposta uma formulação que é por si questionável do ponto de vista ético e existencial. Culpar terceiros não deixa de ser uma maneira de transferir aos outros as nossas responsabilidades.


Sobre o tipo de letra na redação



Olá, boa tarde! Gostaria de tirar uma dúvida
Minha dúvida é em relação à escrita na redação. Tipo, minha letra é misturada, eu utilizo tanto letras de computação como letras cursivas. Isso é proibido em redação? Existe uma norma que proíbe isso? (não sei se o nome que se dá a essas letras são essas que citei).
Michel Filipe 
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          Alô, Michel.

         A dúvida comum dos estudantes quanto à letra com que devem fazer a redação é se utilizam o cursivo ou a caixa-alta. A letra cursiva, como o nome diz, é a letra que corre. Com ela se produz a maior parte dos textos manuscritos. A caixa-alta corresponde à escrita com letras maiúsculas. As bancas aceitam os dois tipos; o importante é que o texto seja legível. Há pessoas que, ao escrever em cursivo, produzem garranchos que ninguém consegue entender (às vezes, nem elas próprias). Nesse caso, o melhor é usar a caixa-alta. Recomenda-se, no entanto, que o aluno sublinhe as letras que iniciam os períodos e as dos nomes próprios; afinal há normas para a escrita das maiúsculas, e o estudante deve mostrar que as conhece. 
        Chegamos à sua pergunta, que se refere a uma possibilidade nova: alternar letras cursivas com letras de computação. O Enem não emitiu nenhuma norma que impeça esse tipo de alternância (assim como, a exemplo dos outros concursos, não se manifesta quanto a o aluno usar a letra cursiva ou a de caixa-alta). Deduz-se que nesse exame os corretores aceitam os diferentes tipos de letra. O importante, repita-se, é que o candidato se faça entender. A banca não pode ver com bons olhos os que tornam mais penoso o extenuante trabalho que já tem, e a má vontade decorrente disso certamente influirá no julgamento que fizer deles. O candidato deve escrever com legibilidade para garantir que o seu texto será lido e avaliado com justiça.

Diferença entre homonímia e polissemia


        Na frase "A pata estava com sua pata esquerda machucada" existe homonímia ou polissemia? Poderia me esclarecer melhor com conceitos e exemplos? Muito obrigado!
Raimundo Gomes
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Alô, Raimundo. 
A polissemia consiste na variedade de significações de uma palavra. Entre os inúmeros sentidos de “coroa”, por exemplo, estão o de 1) objeto que os reis portavam (ou portam) na cabeça para indicar soberania e nobreza; 2) parte do dente revestida de esmalte; 3) mulher de idade avançada.   
A homonímia é a coincidência de forma entre palavras devido, em grande parte, a mudanças fonéticas. Como têm origens distintas, os homônimos pertencem na grande maioria das vezes a classes gramaticais diferentes. Por exemplo: “venda”, substantivo que designa a faixa de pano com que se cobrem os olhos, é homônimo de “venda”, 1ª ou 3ª pessoa do verbo “vender”.
São também homônimos “pata”, feminino de pato, e “pata”, “cada um dos apêndices do animal usado para sustentação e locomoção” (Houaiss).  A origem de “pato” é presumivelmente onomatopaica, ou seja, deveu-se à tentativa de imitar determinado som – no caso, o grasnar dessa ave (o povo parece que gosta de fazer onomatopeias com as consoantes “p” e “t”; veja o caso de “patati” - “patatá”). O curioso é que o homônimo desse vocábulo que representa o aparelho locomotor também tem origem onomatopaica; nasceu do propósito de imitar “o ruído do animal em marcha”.

Dúvida sobre ambiguidade


         "A mãe bateu na filha porque estava BÊBADA.” Quem estava bêbada? Esse é um caso de ambiguidade?
Hégina Lima
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         Alô, Hégina.

        Nessa frase ocorre elipse do sujeito da segunda oração. A elipse, sendo a omissão de um termo facilmente subentendido, promove em alguns casos a coesão textual sem que se precise fazer referência ao elemento mencionado.
       Se digo, por exemplo, “Maria acabou o namoro com João porque era intolerante”, não há como interpretar que o intolerante era João. Caso eu pretendesse dizer isso, marcaria o novo referente (com um pronome, por exemplo): “Maria acabou o namoro João porque ele era intolerante.” Na sua frase “a mãe” figura, por elipse, como sujeito do verbo “estar” – e nesse caso não haveria ambiguidade.
        Há no entanto quem veja diferente e ache que, justamente por constituir uma “lacuna”, a elipse dá margem a mais de uma interpretação. O contexto e o sentido da frase têm influência nisso. O senso comum, bem como a situação descrita, nos faz pensar que a filha e não a mãe é quem tinha “enchido a cara”.
        Diante disso, o melhor é marcar o sujeito da oração seguinte. Com o pronome “ela”, por exemplo: “A mãe bateu na filha porque ela estava bêbada.” Mas veja que, diferentemente da frase anterior (sobre “Maria” e “João”, que é masculino), o pronome “ela” pode instaurar ambiguidade (“ela” quem?). Como nunca é demais ser claro, o melhor então seria retomar “a filha” por meio de um hiperônimo: “A mãe bateu na filha porque a garota estava bêbada”. Abraço.

quarta-feira, 24 de abril de 2019

Botando o pingo no "i"


Gostaria, se possível, de um esclarecimento: omitir da letra “i” o pingo consistiria em transgressão gramatical? Em outras palavras, provas oficiais podem penalizar nesse caso?
Grato, Daniel W. (Limeira/SP)
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         Alô, Daniel. 

       O chamado pingo do “i” é uma convenção que acompanha essa letra. Como toda convenção, deve ser respeitada. Omiti-lo seria praticar um desvio ortográfico. Seria como retirar a cedilha do “c”.
       A cedilha, como se sabe, aparece embaixo da letra “c” para diferenciar a consoante sibilante (ca/ç/a) da gutural (bo/c/a); há uma razão prática para colocá-la. Há também uma razão prática para colocar o pingo sobre o “i”: distingui-lo, quando duplicado, da letra “u” (essa duplicação era muito comum no latim).
        O curioso é que o Acordo Ortográfico fez com que o risco de haver confusão deixasse em parte de existir. Geralmente a duplicação ocorre quando se liga um prefixo terminado por ‘i” a um radical iniciado por essa letra. O Acordo estabelece que, nesses casos, se desfaça a junção por  meio do hífen. Diante disso não há mais como confundir, por exemplo, “anti-inflamatório” com “antunflamatório. Abraço.

Uso do hífen na translineação (mudança de linha)


Professor, se estou fazendo uma redação... e termina a linha estou escrevendo uma palavra com hífen... na outra linha vou terminar de colocar essa palavra devo começar de novo com mais um hífen???
Leny Fontinelle
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        Alô, Leny.          

       Deve pôr o hífen, sim. O objetivo dessa repetição é preservar a ortografia.  A razão é simples. Na chamada translineação (o nome técnico para a divisão silábica), usa-se já um hífen para introduzir o segundo “pedaço” da palavra. Por exemplo: se separo “obscuro” a partir da primeira sílaba, na linha seguinte o restante desse vocábulo deve ser antecedido de um hífen (-curo).
       Suponha agora que você vá separar os componentes de “dedo-duro”.   Trata-se de um composto, por isso os dois radicais que o formam são ligados por hífen (lembro que não ocorreria hífen se houvesse um elemento de ligação entre os dois radicais, como em “pé de moleque”). No fim da linha, então, você escreve “dedo-”. Mas esse hifenzinho que está aí não caracteriza o composto. Indica apenas que a escrita da palavra se prolonga na linha seguinte.  Se no início dessa linha você não repetir o hífen, dará a entender que a grafia da palavra é “dedoduro” (que não existe).  
         Lembre-se de que a repetição do hífen também ocorre quando formas verbais são seguidas por pronomes oblíquos átonos (na chamada ênclise). Caso você separe o verbo do pronome numa forma verbal como “deu-me”, terá que usar hífen tanto após o verbo, quanto antes do pronome na linha seguinte (deu- -me).